Um espaço para revisitar as emoções vividas no Grupo do Facebook: Alentejo-Terra e Gente
terça-feira, 17 de julho de 2012
Os temas do Cante Alentejano
Proponho-me hoje falar dos vários temas que são abordados pelos grupos corais do Alentejo.
Nos meus tempos de menina não havia grupos corais formados, O cante alentejano surgia espontaneamente na ida e vinda dos trabalhos do campo, nos bancos das tabernas .Os cantadores saíam dessas vendas, para a rua sempre em grupo e abraçados percorriam toda a povoação a cantar
.Há muitos anos na diáspora, o cante alentejano continua no meu sangue nos meus genes Ao ouvir estes cantares vem-me à memória o meu tio Jacinto que era um grande cantador de Santa Luzia, Ourique onde todos os domingos ou quase, saia da taberna onde bebia os seus copitos e com os amigos percorriam a cantar as ruas da aldeia.
O tio não raro levava os amigos a casa onde a avó os recebia e convidava com bolo e vinho doce.
Com o cante me vem à memória uma infância salutar passada também nessa aldeia.
Mas prossigamos:
Os cantadores, geralmente trabalhadores rurais cantavam em grupo, divididas as vozes em três naipes: o Ponto, o Alto, e as Segundas Vozes. O Ponto tinha por fim iniciar a moda, retomada depois pelo Alto e seguidamente pelo resto do grupo, constituindo o coro.
O cante alentejano apresenta três tipos de música: as modas lentas, as modas coreográficas e os cantes religiosos.
Quanto aos temas são muito variados O trabalho rural inspira uma série de temas: a lavoura, a sementeira, a monda , a ceifa etc.
Com respeito aos sentimentos, os alentejanos tratam com sensibilidade e por vezes com ironia o amor, a saudade, a tristeza, e consequentemente derivados destes ,o namoro, o casamento, a ausência, a saudade, a morte.
As plantas campestres ou de jardim também elas aparecem nas quadras: A erva cidreira, o alecrim o manjerico, o lírio roxo, o cravo etc.
A Natureza de maneira geral aparece no cante alentejano.”Ao romper da bela aurora”
“Ribeira vai cheia” ou no sudoeste “Rio Mira vai cheio”.
No seu livro “Colos Alentejo” António Machado Guerreiro (falecido há já longos anos que viveu em Colos e se considerava alentejano) tem no capítulo terceiro um item que se refere aos corais quando eles ainda eram espontâneos.
Ele dá uma panorâmica de todas as modas cantadas pelo grupo de Colos. Como as modas passavam de vila para vila em Colos cantavam-.se modas que registavam um certo intercâmbio cultural.
Esta moda veio da serra
Directamente a Garvão
Por cá ninguém na sabia
Veio nos dar animação
E os colenses para redobrar o seu brio cantavam
Ó Colos terra bendita
Já merecias ser concelho
Moras à beira da serra
Para servires de espelho.
E logo algum mais viajado se lembraria de sugerir quadras que evocavam a zona de Beja..
Já não vou a Baleizão
Já não vejo a minha amada
Ó limão verde limão
Ò que fresca limonada.
Beja és a capital
Cá da nossa região
Do distrito aonde vivo
Baixo Alentejo dás pão.
E outras tantas como Serpa .Moura, Pias, Ferreira que são vilas de excelentes cantadores.
Quanto às que exprimem sentimentos são inúmeras sobressaindo as que exprimem o amor e a saudade porque o povo alentejano é um povo de sentimentos fortes e calorosos.
Lá vai o comboio lá vai
Lá vai ele a assobiar
Lá vai o meu lindo amor
Para ávida militar.
O cante é a expressão mais forte da cultura alentejana; é aquele que dá a perfeita imagem da maneira de ser, de estar na vida, de trabalhar e cantar colectivamente.
Por isso é de justeza que o queiramos elevar a Património Imaterial da Humanidade.
E eu estou nessa luta a nível individual e a nível das associações alentejanas para as quais gostosamente colaboro com a minha paixão pela escrita que é idêntica à paixão que tenho pelo meu Alentejo.
Maria Vitória Afonso