Minha Mãe foi rancheira
Num rancho de ceifadores,
Pariu-me lá p'ra ribeira
Toda torcida com dores.
Meu Pai era um ganhão
Seu nome era Bailundo
Lá p'ras terras do suão
Maltês do fim do mundo.
E ali também eu nasci
Numa cama de palhiço
Foi ao meu Pai que ouvi
Já não me lembro disso.
Eu comi açorda de poêjo
E migas de pão rojão
Se dissesse um gracejo
Tiravam-me logo o pão.
Para as bocas alimentar
Lavrei terra, e colhi pão
Fui um moiro a trabalhar
Cheio de suor e sofridão.
Fui um pastor de ovelhas
E dos porcos um maioral
Ensopado até às orelhas
Nas semanas de temporal.
Nesta vida de ganhão
Sonhos, tenho de sobra
Corta-se-me o coração
Rastejar como a cobra.
Sonhava com melhorias
Não querendo ser ganhão
Nestas grandes ganharias
Eu sonhava, ser patrão.
O sonhar do pobre é bom
Mas ao acordar, já não.
O sonhar do rico, é dom
A tudo chega com a mão.
ZÉ RUSSO
14-11-2013